"Vivemos em uma sociedade fútil. Não seja como os outros. Não deixe de ser você mesmo. Não perca sua própria essência".



Não me escondo sempre. Porém quando faço, é difícil me encontrar. Minhas emoções são seletivas... Demonstro à aqueles seres livres e puros que tanto me encantam a cada dia. Não gosto de maldade. Aprecio o ócio e o pensamento. Sou atraída por olhares... Transparentes, misteriosos. Julgo a ignorância o mal da sociedade e o fetichismo a razão dos relacionamentos voláteis e mecânicos. Religião é dúvida e amor é crença. Sorrisos são enérgicos e amigos são anjos. Não tenho a pretensão de ser a melhor, mas boa o bastante para aqueles que prezo. Acredito na classe e na postura. Sem clichês fúteis.
Gosto de abraços fortes, entregas verdadeiras, desejo e paixão.
Não me obrigue a concordar e não tente me prender. Minha alma é livre como um pássaro. Meu coração é honesto. Penso sim antes de falar. Me machuco rápido e sou sensível. Mas também sou forte e guerreira. Não me conte mentiras, por mais lindas que sejam. Se eu amar, amarei. Se chorar, chorarei. Portanto, vou viver.


quarta-feira, 21 de maio de 2014

Último suspiro para a liberdade

Às vezes cansa a perfeição, os bons modos, as boas causas, a responsabilidade, a boa impressão, a etiqueta, a maquiagem. O desgaste do bom gosto, da boa vida, da zona de conforto.

Por que diabos a juventude é tão passageira quando a partir dela temos que construir nosso futuro e ao mesmo tempo perder o juízo? Cansa a dúvida que me consome. Ao mesmo tempo do apreço aos valores morais, às expectativas derramadas desde o nascimento, sinto meu corpo se afogar na linha que cerca meu limite para ultrapassar a safe zone.

Tão logo nos próximos anos devo seguir o script. E o meu tempo de viajar e fazer o que faz o meu coração pulsar? Cansa-me as cobranças da vida para o perfeito. Moldada pela vida, aprecio as virtudes, mas percebo a ausência do cabelo bagunçado, da falta de sinal do celular e da consciência. Onde está o meu tempo para velejar sem destino e experimentar diferentes sensações? Onde se escondeu o místico da liberdade real?

Às vezes no meu primeiro bocejo matinal, abro meus olhos. Desejo pintar o meu cabelo de vermelho, fazer uma tatuagem, sentar em alguma casa noturna e simplesmente ver o dia amanhecer. Almejo o silêncio e o barulho, a audácia e os questionamentos. Tenho vontade de um dia acordar e derramar o conservadorismo no ralo. Viver um dia de revolta e de contentamento, de juventude, de ar fresco. Nas areias quero me deitar e permanecer. Quero sair por aí, sem rumo, sem roteiro.

Cansa ser previsível. Cansa as satisfações. Cansa as perfeições. Para hoje, eu quero mais é ser imperfeita, quero usufruir o tempo que tenho com coisas que me façam realmente feliz. Por que não andar pela praça? Por que não sonhar acordada? Eu não quero ser podada. Eu não quero ser domada. Eu não quero ser frustrada.

Os sonhos vêm e vão, mas não tão rápido quanto o tempo. O tempo é traiçoeiro e se assim mesmo vagarosamente esperamos pelos feitos, nossos sonhos serão enterrados mais rápido que o nosso corpo. A morte pode vir com a ausência do medo, da expectativa e do desejo. Confortável seria a vida toda a seguir os passos certos e esperados por todos. Agrademos a todos e afoguemos nossas vozes! Diga sim para todos e negue sua individualidade.

E daí se me chamarem de louca, inconseqüente? E se não for a melhor escolha? E se eu não acertar sempre, qual é o problema? E se eu não for a medida de menina perfeita? E se, eu for feliz? A felicidade nem sempre está nos caminhos mais simples, que exigem menos dor e esforço. A felicidade pode estar na terra molhada em um sítio no meio do nada, na escalada de uma montanha, no cabelo ao vento, na solitude.

Estou farta da rotina. Extravasar é necessário. Seguir a linha que é ordinário. Poupar a todos é esmagar a vida. Quero ficar se eu quiser ficar. Quero partir se eu quiser partir. A vida tem prazo, e com o passar do tempo cobra juros.

Que não me falte coragem para assumir minhas ansiedades. Que não me falte ousadia para viajar. Que não me falte força para enfrentar a dor de minhas escolhas e que não me falte amor. Porque o amor, para mim, é a única regra a ser seguida. Fé pra viver, energia para concretizar. Sonhos para nunca terminar.


quinta-feira, 8 de maio de 2014

O que falta na Humanidade


Em meio ao mundo, a abstinência do amor é apontada por mim como a responsável por tamanha dor coletiva, sentida, tragada e contínua. Esse incômodo que gera desconforto na boca do estômago, que pressiona as enxaquecas e os conflitos políticos, o tédio e o desacato nas ruas. Essa pressão que nos faz perder de nós mesmos, acreditar nas enciclopédias de doenças psicológicas modernas e exaltar o dinheiro como provedor do sucesso e da felicidade.

Não falo do amor romântico, muito menos aquele exclusivamente maternal. Não falo do amor utópico das fábulas, das ideologias infantis. Falo do amor à vida. Ao contentamento pela existência, à retirada da opacidade ocular, intelectual e cotidiana.

Quando foi que a sociedade se tornou tão apática? Quando foi que deixamos de vislumbrar os nossos próprios corpos, que agora vagam seguindo freneticamente um ritmo induzido, limitado, deturpado? Quando foi que as crianças se tornaram reféns da exploração capitalista e desperdiçaram sua imaginação e irreverência escondidas em aparelhos eletrônicos? Em que período idosos se tornaram utensílios descartáveis, pesos desgastantes e motivo de vergonha?

Diz-me porque a frieza se faz cada vez mais presente. Por que sábios estão calados, manipuladores exaltados, pessimistas alimentados, violentos valorizados?

Ah. Que dor grande que incide a cada fantasia limitada, a cada espontaneidade reprimida, a cada gesto generoso, agora tão recatado. Abraços são desprezados. Os teclados substituíram os timbres vocais.

É culpa da falta de amor.

Falta de deixar o coração bater conforme a própria subjetividade única e restrita a cada indivíduo, que não pode, nunca, ser padronizada. É o descaso com a família, com os pais, com os filhos, o marido, os amigos, os colegas de trabalho, a velhinha que está atravessando a rua, a criança sem escola, a exploração dos incapazes, as mortes abreviadas.

Homens se esqueceram do amor ao submeter mulheres a caprichos sexuais forçados. Mulheres se esqueceram do amor ao abortar o inocente que não pode escolher viver. Jovens se esquecem do amor ao escolher a infelicidade diária de optar por uma carreira que promete maior aquisição financeira. A sociedade se abstém do amor ao revogar à própria consciência e permitir que injustiças se consolidem a cada dia nas mais diversas situações e não temer pela dor e sofrimento alheios. Aglomerados se privam do amor ao abolir o diálogo em prol de programas televisivos alienantes, massificadores e ludibriantes.

O dinheiro reina. Tudo tem um preço. Mas falta o valor às pequenas coisas, que na realidade, acrescentam virtudes, momentos de satisfação, de harmonia e que não podem, pelos menos por enquanto, ser comprados. Falta observar o trajeto na direção, o por do sol após o término do expediente, a manifestação inocente de uma criança indagando sobre o mundo e suas diversas realidades. Falta apreciar o silêncio da madrugada, a paz do contato com a natureza (aliás, fujamos do concreto vez em quando), o nascimento de uma criança, a complexidade e intensidade do sexo não restrito à atividade mecânica, a companhia dos animais, a energia dos jovens e a sabedoria dos idosos, a interação entre faixas etárias, saudável, complementar, viva.

Por que fechar nossos olhos perante a grandiosidade universal, energética, magnética, única e infindável? Somos tão pequenos perto do que nos cerca... Mas temos o dom de expandir nosso conhecimento e percepção para muito além de nosso limite físico. Restringir a vida à atividades repetitivas e egocêntricas é um atentado à arte, à filosofia, ao dom do pensamento, à capacidade intangível do ser humano de se renovar e evoluir. Chega de falta de amor ao mundo, às perspectivas, aos toques, aos sentimentos, às sensações, à espiritualidade.

Chega de contentar-se em absorver o pouco mastigado do que nos é oferecido em embalagens pré-moldadas. Gozamos da capacidade de buscar, de formular nossas próprias inquietações e contentamentos. Vamos viver nossos sonhos e medos, ideais e visões, antes que o cronômetro zere e todas as possibilidades sejam engolidas pelo fim dessa vida.

Vamos marcar o mundo com criatividade, audácia, mudança. Abraços valem mais que seu Ipad novo. E sua vida não precisa ser “marionetizada”. Deve ser vivida, escrita, do jeito que te fizer feliz, te fizer vibrar, sorrir, e principalmente, AMAR.



Mãe


Mães não deveriam envelhecer. Não posso falar por todas, mas pela minha. Complicada, encrenqueira, brava e exigente. Ah, defeitos razoáveis! Contrabalanceados ou por assim dizer, eliminados, por sua infinita carga de amor, proteção e amizade, posso afirmar que não há de existir nessa vida alguém mais importante para mim.

O mundo fala, dita, impõe. Se ela confirmar, está tudo bem. Se repudiar, firmará meu desespero. Sua bronca me balança e seu reconhecimento me impressiona. Me faz querer crescer mais e mais, até atingir o sucesso e produzir algo que possa ser dedicado. Para quem? Para ela.

É minha extensão, meu espelho. Meu mal, meu bem, minha luz no fim do túnel. A quem eu darei satisfação pro resto da vida. Por escolha. A quem eu terei orgulho que meus filhos a intitulem de vó.

Durona e inacessível a casca, que quando se quebra, revela um ser humano sensível, generoso, que dedica a sua vida e esforço pelos filhos que carrega no coração.

Seus ensinamentos são os meus dogmas. Sua verdade, a minha segurança. A minha paz, o meu inferno.

Nunca será indiferente. Nunca será abandonada, esquecida ou deixada.

Te deixar para trás mãe, é abandonar parte de minha alma, de meu coração. É deixar a vida, a cor, a família e o amor. Você me ensinou a ser o que sou e sempre vou querer aprimorar pra te impressionar.

Obrigada pela vida que você me deu, pelo caráter que você formou, pelas oportunidades que você cedeu e pela semente de amor que você plantou.

Reconheço seu esforço e espero um dia poder recompensar pelo menos um décimo da felicidade que você me proporcionou.

Uma grande mãe, um anjo bravinho, um colo confortável, um riso descontraído.

Quero sempre ter esse colo para me recolher e morar na bolsinha do canguru.

Não prometo que estarei sempre. Mas onde eu puder, vou te levar comigo.

Dizem por aí, que os filhos são como pássaros, que voam em busca de seu próprio caminho. Não discordo. Mas em muitas vezes vou te levar para apreciar vôos lindos e diferentes, para que você possa experimentar novas sensações e estar sempre ao meu lado.


Minha mãe, minha amiga. Feliz dia da Família!

Eu te amo!

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Por que escrever?


Sou questionada a todo instante. Você cursa jornalismo por quê? Uma das repostas é sem dúvidas, porque gosto de escrever. E então a segunda pergunta, já quase nem escuto. Já sei exatamente a quantidade de sílabas e a entonação... Por quê? Gosta de escrever por quê?

Resolvi então parar de usar do meu discurso padronizado, robotizado e impaciente para responder a essa pergunta e justamente usar a escrita para explicar a graça de colocar as idéias para fora em um papel, em um guardanapo, no bloco de notas do celular ou no Word.

Não hei de me abster-se a explicar apenas o escrever jornalístico. Não. Até porque quando comecei a escrever, lá pelos meus cinco anos e meio, eu nem sabia a importância do jornalismo e seu poder positivo, negativo, alienante ou mobilizador sobre as pessoas. Hoje sei, mas não vem ao caso.

Escrever para mim é uma arte. Descontínua, intrigante e completamente subordinada a uma perspectiva única: A de quem coloca cada palavra de um vocabulário próprio e as une de forma a transmitir uma mensagem que parte de um imaginário subjetivo, com inclinações que esboçam uma identidade, uma crença, uma luta.

Lembro-me que primeiro escrevi releituras de clássicos da Disney. Sim, eu estava no pré e ao invés de utilizar os lápis de cor para colorir durante a aula de desenho livre, eu tentava manter a coordenação para escrever meia dúzia de palavras, que contavam um fato. Todos os dias eu contava um trecho da estória, até que finalizava e com o ego alto mostrava à professora o livro que havia construído. O prazer era enorme. E ele vinha principalmente pelo poder que eu podia exercer sobre os personagens, cujas características eram modificadas por mim, apenas por mim. Eu tinha domínio sobre as falas, sobre os acontecimentos, sobre os encontros e desencontros. Era muito legal poder retratar a princesa da forma como eu a enxergava, alterar uma mecha no cabelo ou um resquício de sua personalidade. A incrível criação. Criar era poder. Poder de mudar o rumo da história, de tornar real o que antes era restrito ao imaginário.

Até uns dois anos depois eu continuei com a idéia de escrever histórias de princesas, príncipes, fadas, pó mágico e tudo o que o padrão criancês pregava, inclusive o “Felizes para Sempre” encerrava qualquer último capítulo. Hora essa, por que haveria de ser diferente?

Então, aos oito anos, um acontecimento doloroso invadiu o corpo da pequena menina morena, de cabelos lisos, magra e sorridente. Minha família estruturada, completa e feliz perdeu um de seus pilares fundamentais de sustentação. Em duas semanas, da descoberta do câncer ao óbito, meu pai se foi, apagando por um tempo o cor-de-rosa que me protegia do mundo real. Sim, a realidade apareceu muito cedo. Uma criança de oito anos, com um irmãozinho de dois e uma mãe, que sempre fora apaixonada pela família, agora sem prumo, sem peso, sem sorrisos. Foi barra.

Mas quem pensa que parei de escrever está enganado. Comecei a escrever mais e mais, só que de uma forma diferente. Punha no papel as minhas dores, as minhas angústias. Questionava o limbo, escrevia cartas de consolação, além de estórias fantasiosas envolvendo anjos e um mundo sobrenatural. Desenhava em palavras, as minhas lágrimas e a minha saudade, que ainda não tinham total percepção sobre a dimensão que a morte exercia.

Percebi que escrever além de criar, era expor, compartilhar e questionar. Ah, como floresceu uma das minhas principais características de hoje, a de ser questionadora. Percebi que acontecimentos eram questionáveis e que precisava de muitas respostas. Mas identifiquei que perguntar era ainda mais significativo. A pergunta vem de uma mente que avalia um conteúdo físico ou emocional e não se contenta com o exposto. Perguntar é viver. Nem sempre haverá a solução. Mas a importância de não absorver como uma esponja o que é imposto traz um alívio para a alma.

Como toda mãe, orgulhosa como só essa raça pode ser e bibliotecária, apaixonada e principal incentivadora, ela apresentou meus textos a pessoas ligadas à área. Quiseram publicar. Havia mais de duas ilustradoras, editoras interessadas. Então parei de escrever e escondi meus textos. Não queria estar em evidência, não queria que meus pensamentos e minhas criações ficassem sujeitos a uma sociedade crítica e por vezes cruel. Tive medo. Medo mesmo. Não sei se hoje recusaria uma proposta dessas, mas não posso alterar o passado.

Enfim, passado um tempo, voltei a escrever nas minhas horas vagas. Fui crescendo e aperfeiçoando o que tinha aprendido até o momento. Escrevia contos, crônicas, textos sem categorias válidas, pensamentos, reflexões e etc.

Hoje curso jornalismo. Estou no segundo ano já e o tempo passou muito rápido. Acho que encontrei uma profissão que permite que a força das palavras possa influir na sociedade de uma forma direta ou indireta e proporcionar a conscientização, a mudança, a exposição da verdade. Virtude mais importante, em minha singela opinião. Lógico que essa é uma visão utópica. Mas quem não alimenta uma utopia de algo que ama?

Está certo, chega de lamúrias. Não estou sendo prolixa, mas era importante contextualizar. Quer dizer, eu acho. A resposta já está quase saindo. Só gostaria de ressaltar que a leitura é um ingrediente fundamental para quem tem a pretensão de conseguir adquirir um vocabulário grande o suficiente pra expor as idéias, que com certeza, já são por natureza, superiores a qualquer forma de representação.

A resposta (aleluia)

Escrever é terapêutico, é libertador. Principalmente se você possui um espírito selvagem ou uma alma livre reprimida pela sociedade opressora.

A escrita proporciona o encontro seu com você, de seu coração com seu cérebro, de sua composição material e imaterial. De suas perspectivas e seus medos, de seus anseios e bloqueios, de suas dores e seus antídotos.

A cada movimento que constrói uma palavra, um suspiro de alívio atinge e tranqüiliza a mente frenética. Com a escrita você realiza suas maiores fantasias, expõe o que jamais seus lábios seriam capazes de dizer.

É ser racional e inconseqüente. Exatamente. É possível construir paradoxos complementares e autênticos. Quando escreve, você se torna arquiteta de suas próprias contradições, além de ilusionista, manipuladora ou realista. Pode ser dura com textos densos e pesados, pode ser sutil como um bater de asas ou o que quiser.

Escrever revigora a capacidade de pensar e construir. O que somos senão seres pensantes dispostos a deixar alguma mensagem nesse mundo, no qual a única certeza que o envolve, é que estamos de passagem.

Deixe uma mensagem nesse mundo. Um relato, uma carta de despedida, uma proposta de mudança ou uma lástima da vontade de viver mais, uma frase em uma garrafa. Deixe seu último suspiro, ou seu primeiro amor, deixe seu ódio e sua paixão. Derrame sobre todos sua complexidade com ser. Escreva.

Escreva, pois, a cada vírgula você provoca uma reação. Altera o percurso de uma vida, anexa um ideal ou contrapõe dogmas. Esqueça as críticas. Ou as ouça e as interprete, avaliando o que é construtivo. Cuidado com os outros, a liberdade de expressar não deve ferir a ninguém, pelo menos, não de propósito.

E apenas coloque um ponto final quando achar que terminou esse, para começar outro. Boa sorte.



Morte, nem aqui e nem nunca



Pessoas amadas não deveriam morrer. Não, não deveriam. Pessoas amadas guardam dentro delas, pedaços nossos. Pedaços de sorrisos, de planos, de afetividade, de compartilhamento, de emoção e de identidade. Sim, pessoas amadas constituem parcela do nosso ser e aderem pitadas de nostalgia e sonhos em nossa subjetividade. Pessoas amadas nos garantem um norte, uma linearidade na busca da realização e são companhias indispensáveis.


Quando elegemos a quem dividir o nosso amor, não escolhemos por acaso. É uma escolha minuciosa e ao mesmo tempo, estritamente natural que ocorre de forma espontânea e intensa, veloz e avassaladora.


Algumas pessoas amamos desde o nosso nascimento, quando o choro é interrompido por um simples contato de pele, que providencia imediatamente, segurança e ternura. De quem mais eu poderia estar me referindo? Com raras exceções, aprendemos o amor com nossas mães (ou mulheres que cuidaram de nos e nos amaram da mesma forma que a figura materna está sujeita em seu arquétipo). A mãe nos mostra o amor incondicional no cafuné, nas neuras, nas broncas, nos risos, nos castigos e na comida na boca. E logo, crescemos ao lado dela, e de nosso pai, que em segundo lugar, vem ocupando um espaço significativo em nossas almas. O amor dos pais é único e não pode ser dispensado, porque além da sensação boa que nos traz, é responsável por formar o caráter e muitas características para lá de importantes que desde cedo cravadas, esboçarão significados nos viés que a vida disponibilizar, obrigar ou rodear nossos corpos.


E então, depois de todo esse tiroteio amoroso, iniciamos nosso círculo de convivência social, onde aprendemos nas diferenças encontrar as semelhanças e a partir disso, amar. Às vezes, a decepção é três vezes mais forte que o próprio amor que concedemos a determinado elemento. Mas amar, vale a pena, sempre.


O amor é um sentimento único que esboça um sentido puro e sem alicerces relacionados á interesses, categorias. É um sentimento nobre da tabela sentimental da vida. Extravasa o espaço físico e visual e se desmancha em atitudes de dedicação, apreço e respeito. Com o amor, novos substantivos surgem, como a ternura, a felicidade, a alegria, o êxtase, a tranquilidade, e, até mesmo, a paz.


Depois de nosso círculo social, aprendemos um novo tipo de amor. O amor entre duas pessoas. O amor romântico, ou mesmo, ousado. Pode ser platônico, inaceitável, inaudível ou impronunciável. Pode ser mão dupla ou unilateral, pode constituir o bem, como também o mal. Mas é um amor diferente, que é capaz de quebrar corações e restituí-los. Trazer paixão e dor. É um paradoxo universal, procurado, investigado, curtido, sonhado.


Existem ainda amores paralelos. De irmão, de vó, tio, cunhado, de cachorro, gato, papagaio. Mas mesmo que difícil de ser explicado, todo mundo sabe o que é o amor ou ao menos o sentiu passar alguma vez pela vida. Quem não viu, não quis ver. Pois o amor está difundido em todas as esferas globais, universais e até mesmo em gibis.
Depois de todo o aprendizado que passamos, ao absorver o amor que nos é dado, retribuir, amar novos horizontes, dedicar esse sentimento intensamente á determinada categoria, temos de aprender a lidar com algo: A morte. Eu particularmente acho que morte e pessoas amadas é uma combinação grotesca que no momento da criação desse mundo jamais deveria ter sido aceita. Eu reprovaria, sem sobra de dúvidas.


Como assim, nós, em nossa fragilidade humana, temos de lidar com o distanciamento definitivo de alguém/algo que simplesmente colocamos um pouco de nós? Por que aceitar que uma alegria padeça? Por que permitir que um abraço se esvaia, que as palavras e ações se tornem uma mera memória gostosa e altamente dolorida? Por que? Alguém vê lógica nessa situação apresentada? Revolto-me e digo: Não. Não aceito.

O mundo dos Amélie Poulain

Sensíveis, românticos, introspectivos, generosos e com algumas derramadas de lágrimas dos olhos, são vistos aqueles que se identificam com a personagem Amélie Poulain, do famoso filme francês de 2001. Com o aguçamento dos sentidos mais nobres, hoje choram com as injustiças e lutam pela mínima visão positiva sobre as delicadezas da vida.
         O filme, nada convencional e com a ausência de manobras visuais grotescas, marca da atual indústria do cinema, traz à tona, por meio do diretor Jean-Pierre Jeunet, o charme da vida. Das pequenezas, das dores suprimidas, dos anseios mais subjetivos que tomam a alma é que são avaliados um fardo ou um sentido de vida. A personagem principal, Amélie, embalada em suas dores amadurecidas, constrói um novo panorama de visão, que propicia o despertar para um olhar gentil e cauteloso sobre a vida, resultando em ações cotidianas que devolvem essência aos passos sombrios que cercaram todo o seu crescimento. A opacidade em sua vida familiar é substituída pela incansável busca em suprir as carências e obstáculos de terceiros, por vezes, desconhecidos. A generosidade é dividida em um misto de criatividade e audácia ao realizar os feitos, predominantemente, anônimos.
         Em sua incessante ação de feitos solidários (ou levemente vingativos à maldade), em troca da recompensa de sorrisos e contentamentos alheios, ela acaba por esbarrar em uma situação que a coloca novamente em prática de suas doações. Não fosse seu coração a disparar, não seria tão difícil finalizar seu cotidiano. Com a bondade escancarada em suas poucas palavras pronunciadas, Amélie por hora, apaixonada, enfrenta a dor de lidar com os próprios sentimentos, sufocados em uma esfera nada atingível, colocada, talvez, como forma de defesa pessoal às dores de seu passado. Nesse paradoxo imensurável a história se desenvolve. Em seus vãos momentos, ela se contesta sobre a inabalável estrutura alienada em que paira seu interior, emaranhado no medo e no distanciamento. Uma moça jovem, autêntica, que falha na coragem de seguir seus próprios sonhos e emoções.
         Para mim, inesquecíveis, o filme e a personagem vivida pela atriz Audrey Tautou marcam, com poesia, o cotidiano frenético da vida que passa despercebida aos olhos de seus habitantes. Abrindo o paradigma do mecânico e repetitivo, as doces harmonias e travessuras de Amélie brindam ao sutil e profundo requisito existencial valioso e desprezado desde a estrutura econômica até a alienação profunda e vã das ganâncias humanas. O prazer das mínimas experiências encontra seu altar no coração da jovem sonhadora.
         A história é detalhista e foca na avaliação das características e perfis dos personagens. Uma análise subjetiva, mostrada por meio de dados aleatórios à vida dos integrantes. Categoricamente sensível, o filme mostra nuances íntimos e esquecidos.
Curioso e extremamente metafórico, é o personagem dos “ossos de vidro”. Idoso, portador de doença congênita que o impede de sair de casa para evitar acidentes, é o homem que mais atinge os pensamentos de Amélie. As analogias feitas em suas pinturas promovem a discussão entre ambos sobre os entraves da vida, perpassando as expressões dos elementos que compõem o quadro. Através dessas conversas indiretas, a jovem personagem expõe seus conflitos existenciais de modo discreto e peculiar e obtém sábias respostas que interferem em suas perspectivas e posteriormente, em suas ações finais.

Um filme que não poderia ser mais atual. De tão essência, torna-se poesia. Sensível, provoca reações no adormecimento das emoções e resgata o que há de puro em cada espectador. Transforma o que está estático em aspiração de mudança. Em um mundo em que o combustível é o dinheiro, a obra traz a recompensa em forma de emoções simples e intensas, que engrandecem e satisfazem. Na tirania e egoísmo do dia-a-dia, um toque de delicadeza pode enaltecer pontos de bondade. Por que o sonhador é catastrófico? A catástrofe pode estar na morte dos sonhos, na ausência de abraços, na condenação da doação e nos rótulos impostos por uma moderna sociedade tecnológica e ao mesmo tempo, arcaica em seus quesitos espiritual e altruísta.

Sobre a Metamorfose


Mergulhado em suas preocupações cotidianas aflitivas que o machucavam a cada instante ao pensar que ele, pilar fundamental econômico da família, já impotente, de nada seria útil para o auxílio desta, não percebe que sua situação de metamorfoseado seria o grotesco da história e não sua ausência trabalhista. Trata-se de Gregor Samsa, que em uma manhã determinada, vê-se em um corpo estranho e tem de lidar com sua nova realidade.


Críticas contundentes e de certa forma, camufladas em uma bela história de ficção, Kafka descreve o que há de podre na sociedade, com seus valores distorcidos que reduzem a existência humana a um conjunto de ações mecânicas e frenéticas que devem obedecer a ordem ditada pela época, que de bela não tinha nada.


O ser (que não necessariamente é humano) é reduzido a um peso sobrenatural a partir do momento em que este não mais dispõe para a família e sociedade quaisquer vantagens e comodismos para sua sustentação. A valorização não aprecia a alma, a subjetividade e os feitos emotivos e irracionais que constroem relações, e sim a porcentagem de contribuição para a medíocre vida exposta de forma cruel e tão cotidiana.


A solidão de pensamentos, exposta de modo trágico e real, demonstra o enlouquecimento de uma mente sã que, presa entre um cômodo vazio e fúnebre, começa a desvencilhar suas ligações lógicas e memoriais para uma penumbra dolorosa de confusão mental. A solidão que é demonstrada na passagem do tempo também apavora leitores que temem serem deixados à sarjeta quando não mais forem úteis aos seus parceiros, ou mais conhecidos como integrantes da sagrada “família”, instituição histórica declarada generosa.


O que seria de um vazio exposto então à sociedade? Uma sociedade fria, que exige das vidas a massificação robótica e o cumprimento de ordens lucrativas? Uma sociedade que não aprendeu a compreender a dor alheia, a doença, o obstáculo, que suga a vida daqueles que tentam contribuir com algo, para retirar um pouco de sustento básico.


Entregamos nossa energia e sanidade mental e física para comer e podermos sustentar um corpo cansado, esgotado das cobranças infindáveis daqueles que destruíram até o próprio planeta com a desculpa de torná-lo melhor aproveitado (economicamente, obviamente, com a mínima distribuição de renda aceitável).


Prédios se erguem e pessoas caem. Alguns arrotam dólares e outros apodrecem a espera de um copo de água. Filas de doentes a agonizar, enquanto jatos banhados a uísque pousam em paisagens paradisíacas vendidas e restritas.

A classe trabalhadora perde o direito à vida, enquanto cumpre a obrigação do trabalho. Não existe piedade quando se tem a ganância. Qualquer vantagem deve ser extraída. Quem se importa com câimbras, convulsões, depressão e afins quando se pode encher o bolso ao fim do mês? Quanto vale um amor se este não for provedor?


Kafka trouxe à tona uma dor invisível. O desprezo pelo o que deveria ser o fundamental. Expôs o atentado à memória, às boas lembranças, à consideração e à gratidão. Destrinchou o podre da sociedade divisora de funções, que estão acima de qualquer valor humano. A virtude torna-se um lixo altamente dispensável e perigoso para a manutenção da ordem. A submissão é ensinada desde o berço e a morte é inevitável. (Só não pretenda morrer sem ser trabalhando para seu superior).


E, se dentro de cada um de nós, um imenso besouro estivesse a surgir? O besouro que nos impede de colocar dinheiro dentro de casa. O besouro da fraqueza, da indisposição, da doença, da dor, da velhice? Devemos então descartar uns aos outros por momentânea debilitação? Devemos rasgar nossas almas e pisoteá-las tais como na carcaça de um besouro? Ou devemos trancar nossas dores em um quarto escuro até que morram e nunca mais voltem a nos perturbar? Devemos nos policiar e impedir o sentir?


É muito sensível que um escritor tenha a capacidade de entregar em palavras subjetivas a denúncia da dor vivida por uma sociedade alienada em suas catequizações forçadas. Uma ficção mais realista que uma fotografia. Uma metáfora única, sincera, inquestionável.